DUELO MENTAL - O Desafio

É disto que se trata DUELO MENTAL - um desafio aos ouvintes a descodificar o universo que é esta dupla algarvia.
DUELO MENTAL - O DesafioNão é todos os dias que somos desafiados para um DUELO MENTAL. E certamente que não é todos os dias que ouvimos falar de separação entre religião e Igreja, misticismo e obscuridade, aliens e organizações secretas, e tantos outros temas subordinados a uma atmosfera algo abstracta, todos eles envolvidos uma espécie de poesia sombria que nos deixa indecisos entre o belo e o obscuro.

É disto que se trata DUELO MENTAL - um desafio aos ouvintes a descodificar o universo que é esta dupla algarvia.

Fazendo a ponte entre o Spell das mixtapes e o de DUELO MENTAL, podemos notar mudanças significativas. Spell apresenta agora um flow mais regular e consistente mas menos característico; rimas mais completas e trabalhadas mas menos abstractas e com menos margem para o ouvinte se perguntar de que estará ele a falar; uma temática mais variada e abrangente mas menos agressiva e com menos formato de punchline.

O Spell de Duelo Mental é claramente mais maduro e escolhe os temas que aborda, da forma que aborda, de uma forma deliberadamente desfocada, mas profunda em significado, deixando portanto para segundo plano a preocupação com a estética e a forma. Para quem o conhecia de Música de Palavra ou Beats & Rimas e esperava ver uma evolução no mesmo sentido, não é isso que vai encontrar. A título pessoal, sinto que aquilo que Spell ganhou num lado (no conteúdo) perdeu no outro (na forma). Ora eu que adoro coisas esquisitas, adoro-as não só nos temas mas também nas vozes, no flow e na métrica. A voz anasalada, o flow semi-arrastado meio pára-arranca e a escrita que por vezes parecia exprimir um pensamento incompleto podiam ou não ser sinais de falta de experiência. Para mim, eram características que, a manterem-se, com o passar do tempo soariam a uma caracterização forte, a uma individualização do mc que o separava do resto da maralha. E na minha opinião, seria o invólucro perfeito para o tipo de temas que agora aborda.

A nível de instrumentais, também isto se verifica: o álbum é muito (talvez demasiado) homogéneo, o que lhe dá um certo feeling de continuidade e coerência mas parece desafiar pouco Spell a sair da sua zona de conforto habitual. Sem deixar de sublinhar que se trata de uma opinião pessoal, persiste a interrogação: não seria perfeito para Spell um estilo de instrumental mais pesado, entre o apocalíptico, o majestoso e o hardcore, algo na linha de "O Bem Vence Sempre" mas mais intenso e imponente? Embora não esteja dentro do seu estilo mais recente, em termos de sonoridade seria muito interessante. A sensação que fica é que por trás de DUELO MENTAL está um excelente, mas pouco diversificado GI Joe e um poderoso, mas acanhado Spell. Se há alguma crítica a fazer, é que ambos deveriam arriscar mais, levar cada um dos seus estilos (de rima e de produção) mais além.

Brincado um bocadinho com o papel de Deus da música e fazendo um "recorte e colagem" com o Hip Hop internacional, provavelmente Duelo Mental seria um álbum perfeito (mais uma vez, sem me cansar de sublinhar que este 'perfeito' é apenas válido para mim) se tivesse um estilo de instrumental com a força e agressividade de Autism ou Necro mas a melodia e a harmonia de Jedi Mind Tricks. Isto, combinado com um Spell que arriscasse mais, mesmo em termos de letras (pois ao ouvir o álbum de ponta a ponta, sinto que ficou ali muito por dizer!), explorando mais as temáticas e a forma como as aborda, seria perfeito. Por exemplo, senti pouco apelo nas faixas cujo tema central era o Hip Hop (excepto pela faixa "Cirurgia Musical"), sentindo muito mais a tal paixão que todos temos pela cultura/música/whatever em faixas cujo tema central era outro, como em "Imagina". A sério, "sugo o teu sangue, faço música para vampiros" (...) "são anti-depressivos que mudam o teu estado de espírito"... enfim, acho que se nos deixarmos mergulhar na música ela transmite muito mais do que as palavras e o instrumental que a compõem. Um pouco como Atma faz.

Ainda assim, o DUELO MENTAL é um álbum cheio de pontos altos para quem gosta de Hip Hop não formatado. "Cirurgia Musical", com a participação de Reflect - das mais interessantes do álbum - e "Pseudónimo" são um exemplo de Spell no seu melhor, tanto a nível de flow como de rimas. Já "Magia Branca" conta com um novo refrão de Dino, que parece fazer magia em todas as músicas por onde passa e de referir "A Lei do Karma" pelo instrumental.

"Fim do Mundo", com a participação de Filipa Branco, é um fim fantástico para o álbum pois, a par com "Seja Feita a Sua Vontade", tanto Spell como GI Joe têm a mais fascinante prestação de toda viagem musical que é DUELO MENTAL, no que diz respeito ao estilo místico e misterioso por onde ambos se estendem num total de 16 faixas mais uma faixa bónus.

Joana Nicolau
http://nicolau.livejournal.com
Originalmente publicado em: IV STREET MAGAZINE 9º Edição

Joana Nicolau @ 20 Maio 2007 (Dom) - 17:00

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